quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Engasgos

 Quando me olhei no espelho, senti como se fosse outra pessoa ali, por um momento fixei nos meus olhos e eu parecia afundar dentro deles, faltava ar, faltava chão, tive tontura e sensação de que estava sem força nenhuma para continuar sobre meus pés. Não sei quem estava ali do outro lado, mas definitivamente não era eu, pois havia descoberto um ponto fraco do meu precipício e então parecia pisar em cima tão delicadamente que doía sem machucar, entende? E deixava-me presa dentro dos meus próprios olhos.
  Sufoquei. Pensei em pedir ajuda, mas ajuda a quem? Fiquei inerte ali. Se afastasse um pouco da pia e do espelho, simplesmente cairia sem vértebras e em prantos; Acabei afastando e despedaçando então, reguei o único ser vivo perdido no meu precipício, uma flor, a mais linda já vista. Intocável. É, ser vivo! E pensar que tudo morria por lá naquela paisagem cinza, pensar que nunca veria algo assim, pensar que provavelmente se eu a tocar, ela morrerá; Tem sido assim... Desde então tem sido impossível tocá-la, continuo quebrada e a regando com a chuva dos olhos.
  Em meio dessas gigantes desordens e atrasos penso se é aqui que devo continuar. Quero dizer, o que há de útil em um lugar tão morto pra um lírio tão bonito? Uma vez dentro daquele lugar, ou se perdem, ou apenas morrem... Raramente se encontram por lá, raramente vivem por muito tempo; eu, por exemplo, já morri tantas vezes; às vezes sinto que devo tirar essa flor dali, faz tanto o coração doer por inteiro, em pedaços e no meio. Às vezes é preciso morrer e salvar outra vida.

Nenhum comentário:

Postar um comentário